Abra os ouvidos e ouça o batuque que ecoa de uma praça que não existe mais.
Aqui onde você está é a avenida Getúlio Vargas, que desfigurou e acabou matando a Praça Onze. A Praça não era exatamente aqui, mas a cerca de 1,5 quilômetro em direção ao Sambódromo, perto do lugar hoje batizado de Terreirão do Samba. A avenida foi inaugurada por Getúlio Vargas em 7 de setembro de 1944. Ele levou o próprio nome do presidente!
A Praça Onze de Junho foi onde nasceram as primeiras batucadas de samba. Desde o fim da escravidão, em 1888, até os anos 1930, descendentes de africanos e imigrantes italianos, portugueses, ciganos e judeus moravam em cortiços que cobriam todas as ruas da vizinhança. Ali funcionavam também comércios, terreiros de candomblé e casas de famosas mães de santo. As ruas fervilhavam!
Nos fins de semana a Praça Onze virava festa: homens e mulheres batucavam; e durante o carnaval os ranchos passavam por ali para desfilar diante da casa mais famosa da região, a casa da Tia Ciata, em reverência a essa grande mãe de santo baiana. Na Praça Onze, os ranchos viraram escolas de samba e ocorreram os primeiros desfiles de carnaval. Até que mataram a Praça Onze.
Na década de 1930, a prefeitura do Rio, que era a capital do Brasil, decidiu abrir uma grande avenida, engolindo a praça. Os sambistas cariocas protestaram. O ator Grande Otelo procurou outro grande compositor, Herivelto Martins, que escreveu um lindo samba saudando o fim deste local importantíssimo para a alma carioca:
Vão acabar com a Praça Onze
Não vai haver mais Escola de Samba, não vai
Chora o tamborim
Chora o morro inteiro
Favela, Salgueiro
Mangueira, Estação Primeira
Guardai os vossos pandeiros, guardai
Porque a Escola de Samba não sai
Adeus, minha Praça Onze, adeus
Já sabemos que vais desaparecer
Leva contigo a nossa recordação
Mas ficarás eternamente em nosso coração
E algum dia nova praça nós teremos
E o teu passado cantaremos
Em 1941 começaram as demolições, que desalojaram centenas de famílias e derrubaram mais de 500 prédios, incluindo igrejas históricas.
Hoje não há mais Praça Onze e poucos se lembram dela; por isso, esse é mais um dos espectros que rondam a área portuária do Rio de Janeiro.